Voltamos à era Nabi Abi Chedid?

Calendário das competições CBF fica ainda mais bagunçado para os próximos três anos


Eu, sinceramente, queria saber o que passou na cabeça do diretor de competições da CBF, Julio Avellar, pra ter planejado um calendário trienal do jeito que ele foi concebido para o triênio 2026-2028. A julgar pelo monstro apresentado na quarta-feira 1º e oficializado em PDF no sábado 4, o presidente da CBF com certeza é o Nabi Abi Chedid, seja lá de onde ele estiver.

Primeiro que os campeonatos estaduais, que já tiveram uma maior importância entre os anos 10 e 90, passam a contar com apenas onze datas a partir de 2026. Quem está elogiando essa medida deveria repensar seus conceitos. Os times pequenos, principalmente os que não terão chance de se classificar à Série D, são aqui os maiores prejudicados, porque o calendário deles vai ficar reduzido a apenas 11 datas (6, dependendo do formato do estadual).

Já os clubes que estarão na Série A de 2026 vão jogar, ao mesmo tempo, o seu campeonato estadual e a Série A entre 28 de janeiro e 11 de março. Sim, é isso mesmo que vocês leram: num período de dois meses e 12 dias, os 20 clubes de Série A vão disputar duas competições ao mesmo tempo. Pior vai ser pro Mirassol. Por quê? Porque, se a surpresa do Brasileirão 2025 for pra Pré-Libertadores, o técnico vai ter que dividir o time em dois em 25 de fevereiro, por causa do jogo de volta da Pré-Libertadores e da 4ª rodada da Série A que serão jogados no mesmo dia!

Aí, não contente com isso, o Julio pensou: "Por que não reduzirmos as datas da Copa do Nordeste, desmembrarmos a Copa Verde em duas e criar uma Copa Sul-Sudeste?" A volta dos Regionais nos faz reviver 2002. Naquele ano, os clubes grandes jogaram os regionais (Copa do Nordeste / Copa Norte / Copa Centro-Oeste / Copa Sul-Minas) e os pequenos jogaram os estaduais.

Desta vez, vai ser quase a mesma coisa, só que um pouco diferente: os clubes que estiverem jogando Libertadores e/ou Sul-Americana não vão disputar estas competições, cujas datas estão fixadas entre 25 de março (no meio da primeira Data FIFA do ano) e 10 de junho (quase no fim da Data FIFA que antecederá a Copa do Mundo). E nestas duas Datas FIFA, só a Série A vai parar. Os regionais e a Série B não.

Bem, a Copa do Nordeste agora vai ter um período fixo, o que já é algo pra se comemorar. O problema são as outras copas. Primeiro, a Copa Verde desmembrada em duas. Será a volta da Copa Norte e da Copa Centro-Oeste. Na Copa Norte, os times da respectiva região; na Copa Centro-Oeste, os times da respectiva região mais os times do estado do Espírito Santo, cujos clubes já jogavam a Copa Verde. Os campeões destas respectivas competições disputarão a Copa Verde. E a Copa Sul-Sudeste vai ser a mesma coisa da Copa Sul-Minas, só que com o acréscimo dos clubes de São Paulo e Rio de Janeiro.

Ah, tem a Copa do Brasil também. Quase 130 clubes disputarão o torneio. 126, pra ser mais exato. Os clubes pequenos, cujas chances de enfrentar um grande são quase nulas, passam a ter chances ainda mais minúsculas de cruzar com um Flamengo ou Palmeiras da vida. Por quê? Porque o critério de classificação continuará sendo o campeonato ou copa estadual, mas a tabela será feita de acordo com o Ranking de Clubes da CBF.

Explica-se: na primeira fase, os 28 piores ranqueados se enfrentam. Pra segunda fase, avançam 14 pra enfrentar os 74 que estão melhorzinhos, somando 88 equipes. Na terceira fase, os campeões da Copa do Nordeste, da Copa Verde, das Séries C e D em 2025 se juntam às 44 equipes da fase anterior, totalizando 48 (esse número aumenta em 2027 porque todos os  quatro campeões regionais de 2026 jogarão esta fase). Os 24 vencedores desta fase se digladiam na quarta fase. E para a quinta fase, avançam 12.

Esses 12 vão enfrentar, pasmem, os 20 clubes da Série A. E é a partir daí que a Globo, se conseguir os direitos novamente, vai querer transmitir o torneio, como sempre tem feito desde 2013. Ou seja, o Ivinhema que se dane: só jogos em rede nacional. Transmissão local, nem pensar. E aqui, eu penso que seria mais justo recuperar o formato que a UEFA deixou de aplicar na Liga dos Campeões: os 32 times desta quinta fase se dividindo em 8 grupos com 4 equipes, jogando em turno e returno, com os dois primeiros de cada grupo avançando, aí sim, às oitavas-de-final, quartas, semifinais e final. Final esta que, assim como os grandes torneios continentais, será em partida única.

E a Copa do Brasil vai começar em 18 de fevereiro, ou seja, depois do Carnaval, e terminará em 6 de dezembro, encerrando o calendário do futebol nacional, já que a Série A acabará quatro dias antes.

Já as Séries C e D passaram por mudanças significativas. A Série D, ao invés de quatro, passará a outorgar seis acessos à Série C já a partir do ano que vem. Na primeira fase, 96 clubes divididos em 16 grupos de 6 jogam entre si em turno e returno dentro de seus próprios grupos. Avançam os quatro primeiros de cada grupo a um mata-mata. Outro erro crasso do Julio: por que não reagrupar os 64 classificados à segunda fase em 8 novos grupos com 8 equipes cada, como era até a edição desse ano, jogando todos contra todos em turno e returno dentro de seus próprios grupos, pra daí, sim, classificar os 4 primeiros de cada grupo ao mata-mata decisivo?

Mas não: a partir da segunda fase, mata-mata geral. Os quatro vencedores das quartas-de-final sobem direto pra Série C. As outras duas vagas serão disputadas em um play-off realizado pelos perdedores das quartas. E como esse acesso de seis clubes é permanente, a Série C muda de figura: rebaixará 2 clubes para a Série D 2027, aumentando seu número para 24, rebaixando novamente 2 pra Série D 2028 e crescendo para 28 clubes em 2028, divididos em 2 grupos com 14 equipes cada. Os três piores de cada grupo descenderão à Série D 2029.

Aí vocês me perguntam: e as pausas pras Datas FIFA e pra Copa do Mundo? Bem, enquanto a Copa estiver vigente, as Séries C e D não param. E nas últimas Datas FIFA do ano, as Séries B e C também não param. Ficou evidente a proteção aos clubes da Série A, nãoA desculpa dada pela CBF para esse balaio de gato é a de que "há clubes que jogam 70, 80 jogos no ano". E ainda especificou quais clubes eram: os clubes das Séries A e B. É evidente que todo esse protecionismo em cima dos clubes das duas primeiras divisões nacionais acaba respingando nos pequenos que não têm calendário.

O melhor que a CBF deveria fazer era, a despeito das federações, alijar os clubes das Séries A, B e C dos campeonatos estaduais e transformar as primeiras divisões estaduais na quinta divisão brasileira. Seria bom para todos: para a CBF, que justificaria melhor o protecionismo aos gigantes, para as federações, que não perderiam suas joias da coroa, para os clubes grandes, que se preparariam melhor para as competições nacionais e continentais, e para os clubes pequenos, que teriam calendário suficiente para pagar suas despesas.

Portanto, pense, Samir Xaud. O problema não é o calendário apertado para os grandes. O problema é ter diretores de competições na CBF que não sabem planejá-los.