No caso Havaianas, os dois lados estão errados
Eu uso Havaianas desde que me entendo por gente. Aliás, desde que a política não contaminou todos os aspectos sociológicos do país. Atualmente, por exemplo, uso uma Havaianas azul em casa. O que não significa, todavia, que eu seja de um dos lados da moeda chamada polarização. Muito pelo contrário, aliás. Eu sou terrivelmente neutro (não me dobro nem a PT nem a PL, nem a Hitler e nem a Mao). Não defendo quaisquer ideologias políticas. Portanto, não esperem de mim uma análise tendenciosa para qualquer um dos lados nos artigos que aqui escrevo.
Dada esta larga introdução, ambos os lados não têm razão no caso Havaianas. Comecemos pelo lado da Itaúsa, dona da conta da Alpargatas, que detém os direitos da Havaianas. A Itaúsa sabia desde o começo que Fernanda Torres é contestada pelos bolsominions. A situação só piorou com o comercial indo ao ar. A frase “Começar o ano com os dois pés” é tendenciosa sim, mas não politicamente. Não levaram em consideração PcD’s (pessoas com deficiência) que não têm um dos pés. Principalmente os que não têm o pé direito.
Só que reside aí o erro maior da Itaúsa: ao invés de chamar apenas a Fernanda Torres, por que não chamaram também a Cássia Kis? Ora, se é pra começar o ano com os dois pés, ou seja, polarizando ainda mais o que já está desgastadamente polarizado, que chamassem uma atriz bolsonarista também! Mas não: para a agência que fez tal publicidade, o mercado mesmo é apenas de esquerda. Acham que a direita é “agro malvadão”, que é “Faria Limer”, que é isso, que é aquilo… Portanto, que a Itaúsa não queira rebater o argumento de que a propaganda das Havaianas foi tendenciosamente política, porque foi isso que deu a entender.
Porém, a esquerda não sobrevive sem a direita e vice-versa. Afinal, pra um dos lados ter argumentos imbecis e retrógrados, é necessário que o outro lado exista, sobretudo com argumentos tão imbecis e retrógrados quanto. Por isso, a frase supracitada remete à política de alguma forma. Começar o ano com os dois pés visa justamente as eleições gerais de 2026, onde tanto direita quanto esquerda lutarão ombro a ombro pelos votos das suas respectivas massas de manobra (e alguns incautos que caem em suas ladainhas).
Ou seja, se a Itaúsa não tem razão em autorizar uma agência de publicidade a fazer propagandas com suspeita de viés político, tampouco têm razão os bolsominions e alguns outros setores da direita que suspeitaram de viés político na propaganda. Afinal, querem raça mais enviesada que os que apoiam Bolsonaro? Pra eles, é como se a esquerda fosse o diabo e eles fossem os santos enviados por Deus. Viés político-religioso. Coisa que o Irã, a Arábia Saudita e tantos outros já fazem há muitos anos. E pra eles, qualquer pessoa ou entidade que esteja ligada de alguma forma ao governo vigente merece boicote e cancelamento. E aí eu pergunto: em vez de Havaianas, vão usar o que em casa? Louboutin? Coturno? Tênis de corrida? Ah, por favor…
É por causa de militontos como estes que existe a merda do politicamente correto (sim, falemos num português claríssimo). No politicamente correto, tudo passa pelo crivo político. Absolutamente tudo. E tanto petistas quanto bolsonaristas utilizam-se deste mecanismo abjeto para, a todo momento, acusar que tal coisa está ligada mais à direita que à esquerda. Ou já esqueceram que certo ex-ídolo disse que as donas do SBT estavam se “prostituindo” por causa da presença de Lula e do presidente Alexandre de Moraes na inauguração do SBT? O título deste artigo é tão claro como a água de algum rio europeu: burrice não tem ideologia. Há gente burra tanto na esquerda quanto na direita. E isso muitos não querem assumir.
